CAMILO &M
VIANA
[1857: “velha”
como “nova” (15)]
Ser o redator principal, senão único, de A Aurora do Lima era a vontade de Camilo, ao vir para Viana do
Castelo, a 7 de abril de 1857. E com contrato firmado e remunerado, pois como
experiente jornalista e escritor se assumia e era já considerado. Para o efeito,
teria de ter residência, nesta cidade ou arredores. Necessitava, por isso, de
uma casa. Só para si e os seus livros, de início. Depois, logo que possível, para nela albergar também os que considerava ser a sua família.
Esta é a opinião que defendo, sobre esta etapa na vida do Escritor. Segundo
a leitura que faço em cartas que enviou a José Barbosa e Silva (JBS), mas
também em escritos (folhetins, artigos, crónicas, correspondências)
que, sob o pseudónimo João Júnior ou anonimamente, foi publicando no novel
periódico vianês.
Comecemos pelos discursos-textos epistolares.
Entre 15 de dezembro de 1855, data da saída do n.º 1 do jornal, e 7 de
abril de 1857, data da chegada a Viana, Camilo escreveu 44 cartas a JBS, assim
distribuídas (o itálico/negrito indica o n.º de cartas
sobre o assunto em análise): de 15 a 31 de dezembro de 55 - 2 vs. 1; em 56 - 23 vs. 19; de 4 janeiro a 7 de abril de 57 – 19 vs. 19. Ou seja, 39 referências, mais ou menos
explícitas, mais ou menos desenvolvidas. Repare-se que, só nos primeiros meses de
57 (janeiro a 4 de abril), quando se preparava para, com armas e bagagens,
abandonar o Porto e se instalar na foz do Lima, Camilo solicitou e/ou deu
informações a JBS, sobre a questão, em tantas cartas quantas as que escreveu
durante todo o ano de 56.
Como se prevê e melhor se verá, a vinda, colaboração, cargo, projeto e
morada, tudo isto foi preparado e negociado, durante mais de um ano. Negociação
que teve, contudo, as suas vicissitudes, com avanços e recuos, como a leitura
das textos e trechos epistolares tornará evidentes. A transcrição, sequencialmente
numerada, ao longo dos “posts”, de cartas (integrais ou apenas de excertos),
seguirá, por isso, a cronologia da correspondência.
Ora, vamos à
1.ª) Faz-me a assignatura da Aurora
do L[ima], visto que não é cousa tua. Quero por ella compulsar as intelligencias
de Vianna, em disponibilid[ad]e. [Em
carta datável de 18/12/1855]
{BARBOSA, [1919]: 4-5. Respeitada grafia da edição
consultada,
com inclusão, porém, dos grafemas omissos. Também em CABRAL, 1984
(I): 96]}
O generoso amigo de
Viana deve ter enviado, como oferta, o n.º 1 do seu jornal ao seu admirado amigo do Porto. Camilo, não
obstante, pede para ser assinante do Aurora,
ou seja, quer pagar a sua «assignatura», que ficava, «por anno, com estampilha
[postal]», em 4$380 réis. O Escritor encarava profissionalmente o jornalismo e
a escrita. Repare-se como ele justifica o pedido: o periódico não é
«cousa» (obra nem propriedade) exclusiva do amigo; querer «compulsar»
(conhecer, avaliar) a qualidade intelectual da redação do jornal e seus
colaboradores.
Vem a propósito
referir que Xavier Barbosa, nas Cem
Cartas, diz que o Aurora
«estivera para sahir a lume coisa de trez mezes antes», mas que «por quaesquer
motivos hoje [1919] ignorados», tal não sucedeu. O sobrinho dos irmãos Barbosa
e Silva baseia a informação no facto de, em 17 de setembro de 1855, Camilo ter
enviado a JBS «um artigo e um folhetim para serem publicados na Aurora». E acrescenta, citando escrito
camiliano que acompanharia, certamente, a colaboração referida, que o
destinatário «em breve receberia correspondência, de modo a não ficar o jornal
sem o [seu] subsídio». {BARBOSA, [1919]: 3-4]
A referida carta
de 17 de setembro não se encontra, porém, no volume das Cem Cartas, coordenadas, anotadas e truncadas (algumas) por Xavier
Barbosa. Também não se encontra nos dois volumes da Correspondência para os Barbosa e Silva, organizada e comentada por
Alexandre Cabral. [CABRAL, 1984 (I) e (II)]
Terá sido essa
carta uma das que Xavier Barbosa, confesso devotado devoto do culto camiliano, queimou, por conterem
«inconfidências»? [Cf. ARAÚJO, 1990]
Ou encontrar-se-á ainda no arquivo d’A
Aurora do Lima?
Uma última
nota, antes de findar este “post”, transformada em questão.
O artigo e
folhetim, remetidos por Camilo a JBS, em 17 de setembro de 55, terão sido
publicados no n.º 1 do Aurora (15 de
dezembro)?
Se sim, com que
pseudónimo? Nenhuma peça aí se encontra assinada com o nome de Camillo Castello Branco.
Se não, porque
não? É de estranhar que, dada a grande amizade que unia profundamente os dois
amigos, o jovem Barbosa e Silva não tivesse solicitado colaboração a Camilo e
que, por sua vez, o Escritor não lhe tivesse correspondido.
É minha opinião
que Camilo colaborou, efetivamente, no n.º 1 do jornal mais antigo de Viana [cf. VIANA & BARROSO, 2009: 47], nele
publicando dois textos sob pseudónimo. A revelação de uns e outro
ficará, todavia, para quando abordar a colaboração do Escritor n’A Aurora do Lima.
Então, até ao
próximo!
E continue a
(re)ler Camilo!
Referências
ARAÚJO, José Rosa de, 1990: Queimei
Cartas de Camilo. Viana do Castelo: Câmara Municipal de Viana do Castelo.
BARBOSA, Luís Xavier, [1919]: Cem Cartas de Camillo. Lisboa:
Portugal-Brasil Limitada, Sociedade Editora.
CABRAL, Alexandre Cabral, 1984: Correspondência de Camilo Castelo
Branco com os Irmãos Barbosa e Silva – I. (Escolha, prefácio e comentários
de). Lisboa: Horizonte.
-------------, 1984: Correspondência de Camilo Castelo Branco com os Irmãos Barbosa e Silva e com Sebastião de Sousa – II. (Escolha, prefácio e comentários de). Lisboa: Horizonte.
VIANA, Rui A. Faria & BARROSO, António José, 2009: Publicações Periódicas Vianenses. Viana do Castelo: Câmara
Municipal de Viana do Castelo.
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