CAMILO &M
VIANA
[1857: “velha” como “nova” (24)]
Eis,
hoje, os comentários ou observações que, a meu ler, merece a importante carta
de Camilo para José Barbosa e Silva (JBS), transcrita no “post” anterior.
Parece
estar para breve a vinda do Escritor para Viana, a fim de se dedicar, por
inteiro, à direção d’A Aurora do Lima
e aqui, para o efeito, nesta cidade fixar residência. E invoca, note-se, o que
está pactuado (acordado) entre ambos.
Observe-se,
todavia, como Camilo procura, desde logo, assegurar a independência jornalística, sua e do jornal. Ele sabia que o
destinatário pertencia a uma das famílias mais ricas de Viana. Sabia também que,
desde janeiro de 56 (juntamente com o irmão Mateus e José Afonso Espregueira), era
um dos coproprietários do Aurora. [Cf. VIANA & BARROSO, 2009: 47] Além
disso, sabia que o dileto amigo vianês era filiado no partido progressista. Certamente
por isso e a propósito, coloca à sua consideração duas pertinentes questões,
ainda que diga não pretender coagi-lo:
i)
A Aurora não deve ser jornal faccioso.
ii)
Por
mais útil que o jornal se faça, eu penso que ele será sempre um consumidor de
capital improdutivo. Vejo uma rebentação de jornais provincianos que há-de
fanar-se toda à míngua de seiva. Pensa nisto, se não pensaste ainda.
Outro
assunto importante desta carta diz respeito à casa. O Escritor diz concordar com a localização proposta, mas
receia os nevoeiros frequentes. Daí
que, a tal se verificar, preferir avizinhar-se dos montes. É muito
provável que esta casa se situasse lá
para as bandas da Argaçosa ou Meadela. Ainda não é a de S. João d’Arga, vizinha do Monte de Santa Luzia. Camilo
voltará a questionar a localização da casa,
na próxima carta, que, a meu ler, deve ter sido escrita antes da que temos ora
em consideração.
Repare-se,
entretanto, como Camilo está decidido a deixar o Porto e instalar-se, em Viana,
de armas e bagens («Quantum habeo mecum
porto = Comigo vai tudo o que tenho»). E com ele viria também D. Eufrásia, a sua generosa hospedeira,
amante e dedicada amiga, a quem designava também por «La Florêt em 3.ª mão».
Camilo
refere-se a D. Eufrásia em mais quatro cartas. Na primeira, datada de 03/05/1853, escreve, a dado passo, que o seu espírito se sente enojado com o muito pasto da mesma impressão. Já não digere, por isso, os indigestos
carinhos desta sua amiga íntima, precisando, portanto, de segundas ou vigésimas
núpcias, caso contrário, bestializa-se. {Cf. Barbosa, [1919]: 106 e Cabral, 1884 (I): 62} As três cartas
restantes, em que se refere a Eufrásia (Carlota de Sá, seu nome completo), são
posteriores à carta transcrita no “post” anterior. Na devida altura,
apresentarei outros dados sobre as relações de Camilo com esta sua «hospedeira
integral», como lhe chamou Aquilino Ribeiro. [RIBEIRO, 1961 (II): 57]
Camilo
está, mais uma vez, disponível para ajudar o amigo do coração vianês a publicar,
em jornais, a sua correspondência,
isto é, cartas-folhetim, artigos, crónicas, poemas. Desde 1850, aliás, que o
Escritor publicava e/ou apadrinhava a publicação de textos de JBS, em jornais
de Lisboa e/ou do Porto. [(Re)ver “post” publicado, no blogue E-TERNO RETORNO,
em 14/01/2014] Mas, agora, Camilo oferece-lhe as páginas d’O Clamor Público, de que é o redator
literário, cujo 1.º n.º sairá em 15/09/56, como de facto aconteceu. É que,
em carta datada de 24/07/56, informava JBS que a efémera carreira - Como o jornalista
sabia, profissionalmente, do que falava! -
deste periódico portuense teria
início no mês próximo. Agosto, portanto. Mas, enfim, foi a meio de setembro.
A
este efémero jornal já me referi em alguns “posts” recentes, a propósito da
transcrição, no Aurora, dos folhetins
da Peregrinação [sobre a face do globo], saídos, inicialmente, no jornal A Verdade e continuados, depois, no Clamor. [(Re)ver “post”, neste blogue,
de 14/06/2017] Interessantes, no mínimo, são aquelas afirmações - irónicas,
evidentemente - sobre os últimos capítulos da Peregrinação: que devem ser a
mostarda de muitos narizes, por um lado, e que neles (capítulos) disse coisas que nem eu [ele]
entende, por outro. Resta-nos (re)ler a narrativa/crónica «Do Porto a Braga»,
incluída, depois em Duas Horas de Leitura,
em 1857, com segunda edição aumentada, em 1858. [Cf. BRANCO, 18582: 87-152].
Evaristo
Basto, um dos redatores d’O Clamor
Público, foi um dos peregrinos que,
juntamente com os irmãos Luís e José BS, acompanharam Camilo na excursão ao Bom
Jesus de Braga. [(Re)ver “post” de 09/06/2017]
Alexandre
[José da Silva] Braga [Júnior] (1829-1895) e [António José Coelho] Lousada
(1828-1859) foram escritores, jornalistas e amigos de Camilo. [Cf. CABRAL, 20032: 111 e 450]
Até
ao próximo, então!
E
continue a (re)ler Camilo.
Referências:
BARBOSA, Luís Xavier, [1919]: Cem Cartas de Camillo. Lisboa:
Portugal-Brasil Limitada, Sociedade Editora.
BRANCO, Camillo Castello, 18582: Duas Horas de Leitura. Porto: Cruz Coutinho, Editor.
CABRAL, Alexandre Cabral, 1984: Correspondência de Camilo Castelo
Branco com os Irmãos Barbosa e Silva – I. (Escolha, prefácio e comentários
de). Lisboa: Horizonte.
-------------, 20032: Dicionário de Camilo Castelo
Branco. Lisboa: Caminho.
RIBEIRO, Aquilino, 1961: O
Romance de Camilo (Vol. II). Bertrand: Amadora.
VIANA, Rui A. Faria & BARROSO, António José, 2009: Publicações
Periódicas Vianenses. Viana do Castelo: Câmara Municipal de Viana do
Castelo.
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