quinta-feira, 18 de junho de 2020


Cláudio Basto e Camilo
[Continuação]


03. Três cartas de Camilo

Continua-se a apresentação – anotada – de artigos que Cláudio Basto, médico, professor e investigador vianês1, dedicou a Camilo.


 Neste apontamento, reproduz-se a cópia integral da transcrição que Cláudio Basto faz da segunda carta que Camilo dirigiu ao seu amigo e contemporâneo Henrique Guilherme Tomás Branco.


03.2. Carta II

A segunda carta é recomendação. Ajunta à simplicidade grata da forma – digna delicadeza. Ei-la{2}:


Transcreve-se, de seguida, esta carta, com ortografia e pontuação atualizadas, abreviaturas desenvolvidas, e chamadas para notas consideradas pertinentes, entre chavetas, por não constarem do autógrafo nem da sua transcrição feita de Cláudio Basto. Por não corresponder, assim, completamente à leitura que o investigador vianês reproduz em Três Cartas de Camilo, utiliza-se o tipo «palatino linotype», em itálico:

Meu amigo!
Este nome que te dou já vem de 1849. Dezanove anos, meu Branco! O que lá nos fica! Mocidade, alegria, ilusões, forças, crenças, tudo!
De anos a anos te vejo de relance, e apenas tenho tido tempo de ver em ti um dos raros rapazes que restam da plêiade da nossa alegre juventude.{3} Eu passo a maior parte do ano rusticando entre uns pinhais do Minho; a outra parte flanando ociosamente nas praças de Lisboa. Para lá vou no fim deste mês, onde me tens como criado e amigo.{4}
Um meu primo, Pedro Pinto Castelo Branco, empregado na tua secção, ou como se chama, carece da tua benevolência para que lhe não tirem esse pequeno provento de que depende. Rogo-te que sejas amigo dele, e lances à minha conta os obséquios que lhe fizeres. Não duvidei instar a tua benquerença a favor dele, confiado em que tu serás para ele o que eu seria, dadas iguais circunstâncias, para um teu afilhado.{5}
{6}
Sê feliz, se podes, e manda
                            o teu velho amigo,

Vila Nova de Famalicão, 05 de dezembro de 1868.

                                                         Camilo Castelo Branco.


Cláudio Basto termina esta parte do seu «folheto», tecendo um brevíssimo comentário sobre o estado psicológico de Camilo:

A desesperança, que se trai no começo desta carta e na eloquente frase do seu final «sê feliz, se podes», vinca-se fortemente nestoutra, breve e intensa, de consolação a Henrique Guilherme Tomás Branco, pelo falecimento de uma filha (1) […].
_____________________

(1) Na gravura não foi reproduzida a tarja negra do papel.


À reprodução desta carta de Camilo, segu(i)ndo a reprodução e leitura de Cláudio Basto, em Três Cartas de Camilo, será dedicado o próximo apontamento.


 Notas e referências

Resumo biobibliográfico e outras referências a Cláudio Basto, em «0. Introdução» AQUI. Sob o título genérico de «Cláudio Basto e Camilo», foram já publicados, neste blogue, além do referido, os seguintes apontamentos:
- «01. – “Notas Camilianas – I”», AQUI.
- «02. – “Notas Camilianas – II”», AQUI.
- «03. - «Três cartas de Camilo» e «03.1. – “Três cartas de Camilo”: “notícia informativa”», AQUI.
- «03.  «Três cartas de Camilo» e 03.2. – «Carta I», AQUI.

{2}  O artigo de Cláudio Basto é copiado, neste apontamento, na sua versão integral, se bem que fragmentado em trechos, a que se dará a necessária conexão. Utiliza-se, na sua transcrição, para ser visivelmente melhor reconhecido, o tipo «arial». A carta encontra-se reproduzida em BASTO, 1917a: 09-10 (fac-símile zincogravado do autógrafo) e 11 (transcrição do mesmo). Cláudio Basto volta a escrever, como na transcrição da carta I, o «q sem til» advertiu «por não haver na tipografia q tilado».
(Re)ler BASTO, 1917a: 06 e/ou AQUI.
A carta II, ocupa páginas distintas. Apresenta-se, todavia, como no apontamento anterior, em paralelo (zincogravura vs. transcrição), a fim de se facilitar a sua eventual leitura comparativa.

{3}  Sobre as relações de Camilo com o destinatário desta carta, seu amigo e contemporâneo, desde a juventude, (re)ler AQUI, nomeadamente a nota 2.

{4}  No seu excelente Dicionário, sobre a vida e a obra (ativa e passiva) de Camilo, Alexandre Cabral regista, entre os dados referentes ao ano de 1868: «[…] Deslocações a Lisboa, Porto, Coimbra e Braga, provavelmente por causa da sua atividade de bibliófilo/antiquário», para cuja entrada/verbete remete.
(Re)ler CABRAL, 20032: «CRONOLOGIA», 279.

{5}  O «primo», para quem Camilo pede a manutenção do emprego, a Tomás Branco,  na «secção» de que era «diretor de obras públicas» ‒ a exercer o cargo, então, em Vila Real, desde 1865 ‒ não se chamava «Pedro», mas sim Isidoro. Cláudio Basto não leu corretamente o nome. Analisado, com atenção, o grafema camiliano, verifica-se que o «P» maiúsculo, inicial do nome próprio «Pedro», não é igual ao «P», inicial do apelido Pinto.
Os estudos sobre os familiares de Camilo, em 1917, por outro lado, ainda não tinham alcançado o desenvolvimento e a divulgação que vieram a verificar-se depois, sobretudo com a aproximação do primeiro centenário de nascimento do escritor (1925). O investigador desconheceria, certamente, que Camilo tinha um primo chamado Isidoro.
Isidoro Pinto Castelo Branco era filho de Rita Emília da Veiga Castelo Branco (1776-1874) e da sua relação marital com João Pinto da Cunha (1795?-1850), que viria a ser o seu segundo marido. Casaram-se em 22/03/1846, dia em que Isidoro e o seu irmão, primogénito, Manuel Maria, nascido em 1826, foram «reconhecidos e legitimados», até então «registados como filhos de pais incógnitos».
(Re)ler CABRAL, 20032: «CASTELO BRANCO, Rita Emília da Veiga», 193-194; e id.: «CUNHA, João Pinto da», 282-283.
Recorde-se que em 1836, depois de ter ficado órfão também de pai em 22/12/1835 ‒ de mãe já o era desde 06/02/1827 ‒, Camilo e a sua irmã Carolina Rita, mais velha do que ele quatro anos, foram remetidos para Vila Real, sendo entregues aos cuidados desta tia, então ainda amante de João Cunha, como seus tutores e administradores dos bens (propriedades e dinheiro) herdados de Manuel Joaquim Botelho Castelo Branco.
(Re)ler, além das entradas/verbetes acima referidas/os, entre outras/os aí referenciadas/os, em id.: «BIOGRAFIA», 95; «CASTELO BRANCO, Carolina Rita Botelho», 183-185; «CASTELO BRANCO, Manuel Joaquim Botelho», 189-190; «CRONOLOGIA» [anos de 1825 a 1840], 274; «BOTELHO, Domingos José Correia», 105-106; «MÃE DE CAMILO», 468-469; «VILA REAL», 819-821.
E, além das várias biografias de Camilo, entretanto publicadas, é de (re)ler, também, CLÁUDIO, 2006. Nesta obra, Mário Cláudio romanceia a infância e os antepassados de Camilo, alcunhados de «Brocas», em Vila Real.

{6}  Na sua transcrição, Cláudio Basto não respeitou este espaço.
  

Bibliografia [grafia atualizada]

BASTO, Cláudio, 1917: «Notas Camilianas – I», em Lusa [Ano I, n.º 2, de 01/04, Vol. I]. Viana do Castelo, p. 13.
------------, 1917a: Três Cartas de Camilo. Viana do Castelo: Lusa.
------------, 1918: «Notas Camilianas – II», em Lusa [Ano II, n.º 41 e 42, de 15/11 e 01/12), Vol. II. Viana do Castelo, pp. 137-138.
CABRAL, Alexandre, 20032: Dicionário de Camilo Castelo Branco (2.ª ed. «revista e aumentada»). Lisboa: Caminho. [1.ª ed., 1989]
CLÁUDIO, Mário, 2006: Camilo Borca (romance). Lisboa: Dom Quixote.

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